MEDITAÇÃO VI.
JESUS DORME NO PRESÉPIO.
O sono de Jesus Menino era curto e penoso. Uma manjedoura servia-lhe de
berço, a palha formava o seu leito e travesseiro, de sorte que o seu
repouso era freqüentemente interrompido pela dor que lhe causava essa
cama tão dura e incômoda, e pelo rigor do frio que reinava na gruta. Não
obstante, de tempo em tempo o tenro menino adormecia apesar de todos os
seus sofrimentos.
Mas o sono de Jesus diferia muito do das outras crianças. O sono das
outras crianças lhes é útil para a conservação da vida, mas não para as
operações da alma, as quais são detidas pelo entorpecimento dos
sentidos. Não foi assim o sono de Jesus. Eu durmo, mas o meu coração
vigia. Seu corpo repousava, mas sua alma vigiava; pois em Jesus, a
natureza humana estava unida à pessoa do Verbo, que não podia dormir nem
sofrer o efeito dos sentidos. O santo Infante dormia pois; mas dormindo
pensava em todas as penas que devia sofrer por nosso amor durante a sua
vida e a sua morte. Pensava no que devia suportar no Egito e em Nazaré,
onde viveria uma extrema pobreza e obscuridade; pensava sobretudo nos
açoites, nos espinhos e nos opróbrios, nas agonias, em todos os
tormentos da paixão e na morte desolada que teria de sofrer na cruz; e
dormindo, tudo oferecia a seu Pai eterno, para nos obter o perdão dos
pecados e a salvação. Assim, até dormindo, nosso Salvador merecia por
nós, aplacava a seu Pai e nos proporcionava graças.
Peçamos-lhe que, pelo mérito de seu bem-aventurado sono, nos livre do
sono mortal dos pecadores, que dormem miseravelmente na morte do pecado,
no esquecimento de Deus e de seu amor; e que nos dê, ao contrário, o
sono feliz da Esposa sagrada, da qual Ele dizia: Não perturbeis o
repouso da minha dileta, deixai-a dormir quanto ela queira. O doce sono
que Deus dá às suas almas amadas não é outra coisa, segundo S. Basílio,
que um profundo esquecimento das criaturas. A alma o goza quando se
esquece inteiramente de todos os objetos terrestres para só pensar em
Deus e no que interessa a sua glória.
Afetos e Súplicas.
Ó caro e santo Menino, vós dormis; ah! como me encanta o vosso sono!
Para os outros o sono é a imagem da morte; mas em vós é um sinal de vida
eterna, pois que repousando mereceis para mim a salvação eterna. Vós
dormis, mas o vosso coração não dorme: pensa em sofrer e morrer por mim.
Dormindo orais por mim e me obtendes de vosso Pai celeste o descanso
eterno do paraíso. Mas, antes que me introduzais no céu, como espero,
para lá repousar convosco, quero que repouseis sempre em minha alma. Ó
meu Deus, tenho-vos repelido outrora; mas tanto batestes à porta do meu
coração, ora por temores, ora por luzes, ora por apelas chios de
ternura, que creio já tenhais entrado nele. Sim, eu o creio, pois sinto
uma grande confiança de haver recebido de vós o meu perdão; experimento
profundo horror e sincero arrependimento das minhas ofensas contra vós;
esse arrependimento me causa grande dor, mas uma dor sem perturbação,
uma dor que me consola, e me dá a segurança de ter obtido o meu perdão
da vossa bondade. Agradeço-vos, meu Jesus, e vos peço não vos afasteis
mais de minha alma. Sei que não saireis dela se eu vos não expulsar; é
essa a graça que vos peço e suplico-vos me ajudeis a pedi-la sem cessar:
não permitais vos torne a banir do meu coração. Fazei que tudo esqueça
para só pensar em vós, que sempre pensastes em mim e na minha
felicidade. Fazei não cesse de vos amar nesta vida até que minha alma
unida sempre a vós voe aos vossos braços para repousar eternamente em
vós sem temor de vos perder.
Ó Maria, assisti-me durante a vida, assisti-me na hora da morte a fim de
que Jesus repouse sempre em mim e que eu repouse sempre em Jesus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário