3.1 - SER UM COM DEUS
Para onde o
Menino-Deus nos conduzirá nesta
terra, isto não
sabemos e não deveríamos perguntar
antes do tempo.
Só sabemos que para aqueles que
amam o Senhor,
todas as coisas servem para o bem. Os
caminhos pelos
quais o Senhor nos conduz, levam-nos
para além desta
terra.
Ó troca
maravilhosa! O criador do gênero humano
encarnando-se,
concede-nos a sua divindade. Por
causa desta obra
maravilhosa o Redentor veio ao mundo.
Deus se tornou
Filho do homem, para que os homens
se tornassem
filhos de Deus. Um de nós rompeu
o laço da
filiação divina, e um de nós devia reatar o
laço, pagando
pelo pecado. Nenhum da antiga e enferma
raça podia
fazê-lo. Devia ser um rebento novo, sadio
e nobre.
Tornou-se um de nós e, mais do que isto:
unido conosco. O
maravilhoso no gênero humano é
que todos somos
um. Se fosse diferente, estaríamos
lado a lado,
como indivíduos autônomos e separados, e
a queda de um
não poderia ter se tornado a queda de
todos. Podia ter
sido pago e atribuído a nós o preço da
expiação, mas
não teria passado a sua justiça para os
pecadores, e não
teria sido possível nenhuma justificação.
Mas Ele veio,
para tornar-se conosco um corpo
místico. Ele,
nossa cabeça, nós, os seus membros. Po-nhamos nossas mãos nas mãos do
Menino-Deus, pronunciando
o nosso “Sim” ao
seu “Siga-me”. Então, nos
tornamos Seus, e
o caminho está livre, para que a sua
vida divina
possa passar para a nossa.
Isto é o começo
da vida eterna em nós. Não é
ainda a visão
beatífica de Deus na luz da glória, é ainda
escuridão da fé,
mas não é mais deste mundo, já é
estar no Reino
de Deus. Quando a bem-aventurada
Virgem
pronunciou o seu “Fiat”, aí começou o Reino
de Deus na terra
e ela se tornou a sua primeira serva.
E todos, que
antes e depois do nascimento da criança,
por palavras e
obras, se declararam a seu favor: São
José, Santa
Isabel com seu filho e todos os que estavam
ao redor do
presépio, entraram no Reino de
Deus.
Tornou-se
diferente do que se pensou, conforme
os salmos e
profetas o reinado do divino rei. Os romanos
continuaram os
dominadores da terra, os sumo sacerdotes
e os doutores da
lei continuaram a subjugar o
povo pobre.
De forma
invisível, cada um, que pertencia ao
Senhor, trazia o
Reino de Deus em si. O seu fardo terreno
não lhe foi
tirado, e sim outros fardos acrescentados;
mas, o que ele
trazia dentro de si, era uma força
animadora,
fazendo o fardo suave e a carga leve. Assim
acontece ainda
hoje com os filhos de Deus. A vida divina,
acesa em sua
alma, é a luz que veio nas trevas, o
milagre da noite
santa. Quem traz esta luz dentro de
si, compreende
quando se fala dela. Para os outros, porém,
tudo o que se
pode dizer a respeito, é um balbuciar
incompreensível.
Todo o evangelho de São João é
um canto à luz
eterna, que é amor e vida. Deus está
em nós e nós
nele, esta é a nossa parte no reino de
Deus, para a
qual a Encarnação colocou o alicerce.
3.2 - SER UM EM DEUS
Ser um com Deus:
este é o primeiro passo. Mas,
o segundo é a
conseqüência do primeiro. Cristo sendo
a cabeça e nós
membros do corpo místico, estamos
unidos elo a
elo, todos somos um em Deus, uma única
vida divina. Se
Deus é Amor e está em nós, então não
pode ser
diferente o nosso amor para com os irmãos.
Por isto o amor
humano é a medida do nosso amor a
Deus. Mas, é
algo mais do que o simples amor humano.
O amor natural
se dirige a um outro, ligado pelos
laços do sangue
ou por afinidades de caráter ou por interesses
comuns. Os
outros são “estranhos”, que “não
nos importam”,
talvez até por seu jeito antipático, de
forma que
mantemos a devida distância. Para o cristão
não existe “gente
estranha”. Próximo é aquele que encontramos
em nosso caminho
e que mais necessita de
nós;
indiferentemente, se é parente ou não, se a gente
gosta dele ou
não, se ele é “moralmente digno” da
nossa ajuda ou
não. O amor de Cristo não tem limites,
ele nunca
termina, ele não recua diante da feiura ou
sujeira. Ele
veio por causa dos pecadores e não por
causa dos
justos. E se o amor de Cristo mora em nós,
então, façamos
como Ele, indo ao encontro das ovelhas
perdidas.
O amor natural
visa a ter a pessoa amada para
si, possuindo-a
de forma mais exclusiva. Cristo
veio, para
devolver ao Pai a humanidade perdida;
e quem ama com
seu amor, este quer os homens
para Deus e não
para si. Este é, ao mesmo
tempo, o caminho
mais seguro para possuí-las
para sempre;
pois, se amamos uma pessoa em
Deus, então
somos com ela um em Deus, enquanto que o vício da conquista muitas vezes -
mais cedo ou
mais tarde - sempre resulta em
perda.
Há um princípio
válido para todas as almas e
para os bens
exteriores: quem, ambiciosamente,
se ocupa em
ganhar e apropriar, perde; porém,
aquele que tudo
oferece a Deus, ganha para
sempre.
Fonte: Santa Edith Stein, O Místério do Natal, Editora da Universidade doSagrado Coração